Percebo as pequenas coisas:
o zumbido de uma geladeira,
o atrito do tecido
de uma camisa antiga
contra a pele, o som
dos saltos de madeira
sobre o cimento arenoso,
o sentido
de uma conta telefônica
vencida.
Quando se
pára para
pensar, a maior
parte da vida
é senão
um acúmulo
de pequenas coisas,
como geladeiras
que zumbem ou telefones
cancelados.
De certa forma,
sou como
um velho amanuense,
espanando
as superfícies
da minha vida.
Perscrutando
o ordinário, em busca
de uma conexão
subjacente.
No escuro, o menino perguntava
(o que é o mundo?)
apenas para escutar sua tia afirmar
(uma casa dentro de uma casa)
ou simplesmente para sua mãe responder
(uma ala inacabada do céu).
Como alguém poderia adivinhar,
naquela casa, e nas outras que se seguiriam,
que a questão encontraria
seu começo de resposta
crescendo dentro daquele que perguntou,
aquela criança insone,
o predileto da noite?
Mais tarde, já adulto
deitado na assonia,
ele se pergunta outra vez,
meramente para ouvir
o silêncio assaltá-lo
(essa noite se arqueando sobre sua admiração,
o fado próximo que se achega na alcançadura)
e se lembrar que durante
essa parca intermitência,
esse imenso adeus
que se prolonga,
cada um deve fazer
do seu peito um sacrário,
antes que uma visita
tão estrangeira e esquiva
como Deus se avizinhe.
Minha vontade estende
seus olhos longos para a folha.
A introspecção da paisagem:
fazendo massa crítica para escrever.
Olímpica em sua indiferença,
a musa fica lívida:
e me dá um branco.
A cúpula do céu,
repartida em poças,
após a chuva.
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