A batida do relógio parcela meu dia.
Preencho minha melancolia
com rituais de sobrevivência.
Esqueço-me nessa inadvertência
até meu próprio nome
não fazer mais sentido.
Não sinto frio, nem fome,
nada me vem ao ouvido.
Quase acontecimentos
que se acumulam,
regalos e descontentamentos
que se anulam.
Escrito por
Fabrício César Franco
domingo, 20 de outubro de 2013
Efeméride,
Identidade,
Inquietude,
Melancolia,
Ultraje
10
comentários
A náusea
Começou: meu corpo, consumpto e lasso,
aturdido no cânion dos lençóis,
vai se enrodilhando como caracóis,
sob o peso do meu cansaço.
Sem indício de andaime, sou lançado
nesse ilhéu que se tornou minha cama.
Cercado pelo sono por todos os lados,
vou me alastrando pelo panorama
de um extenuante langor de domingo,
sonhando com a semana, onde me extingo
num abrandamento torpe e servil
em labores de cunho mercantil,
que me reduzem a mero perfil –
cadastro, ficha, menos do que um pingo.
Escrito por
Fabrício César Franco
Ela me sorri
com seu ar de entrevero.
“Consegui essa quando
eu tinha dezenove anos”, ela diz,
enquanto eu desenho de volta no tempo
na linha em seu peito.
Penso num coração aberto,
inciso e funcionando novamente.
Silenciosamente tocando seu passado,
eu sinto um estranho espasmo de inveja.
Meu coração,
quebrado nem sei quantas vezes,
não tem cicatrizes visíveis.
Escrito por
Fabrício César Franco
Como uma sombra no pulmão
escurecendo as bordas
da respiração, granulação
no olho, areia
no sapato talvez. Esteve
sempre lá, nunca
completamente
cingida pela consciência.
Algo escuro
no canto das horas,
um cálculo, um dogma,
um fato consumado:
a certeza
de haver espaços sem nomes
entre os dias
enquanto se desfraldam,
que nos levam
cada vez mais
perto do Hades,
onde nem a linguagem alcança.
Não é
angústia, nem tristeza,
sequer ansiedade.
É aquém,
apoucado e quase menor,
uma discórdia acanhada
entre esse sol burocrático
de cartão postal
e a insolação que cresta
por dentro.
A singela discrepância
entre o genuíno sorriso
e o esgar na fotografia.
É o saber-nos
engolidos, sem pressa,
pela peçonha da inconformidade.
Perceba,
tardiamente,
que a toxina
é um líquido paciente.
Bem-vindo,
você também está vivo
e sente.
Escrito por
Fabrício César Franco
Assinar:
Postagens (Atom)