quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Sinopse dos dias


O truque, dizem,
é se deixar para trás,
disfarçar-se
no corpo inconsiderado
de um homem que sempre fui
destinado a ser
e acelerar minha pressa
em direção aos compromissos assumidos.
A testa expõe seus vincos,
como se a antever
o que virá:
a lemniscata do ponto de interrogação,
o adelgaçamento da paciência,
da fé,
da confiança.
Mas aqui onde
o dialeto não consiste
de palavras mas de horários,
não importa a presciência.
Há simplesmente algarismos.
Há simplesmente a agenda,
escondendo em seus cronogramas
o ano que se agrisalha
quotidianamente,
o para sempre que vamos
deixando escapar
a todo o momento.
E nós rogamos
para que os trincos
velem as amarguras,
que as portas fechadas
filtrem as decepções,
que no fim de cada dia
haja algo que tenha
feito sentido,
qualquer um.


10 comentários:

Frederico Franco disse...

Sabe?
Reúno forças para acompanhar os ponteiros do relógio.
São muitos os compromissos, são tantas as responsabilidades...
que esqueço que gostaria de ter um tempo para mim.

Fabrício César Franco disse...

Mano bróder,

Fato é que precisamos, vezenquando, dar um basta nos alaridos dos compromissos para curtirmos o silêncio do que realmente queremos fazer. "Se cuida, Latorraca!".

Anne Barreto disse...

Adorei!!!! =]

Fabrício César Franco disse...

Um de meus textos mais sofridos, Anne. Escrevi há mais de 20 anos, acredita? Com o passar do tempo, ficou como uma cicatriz, que dói em alguns (bem) poucos dias. Ainda bem.

Beijo!

Anne Barreto disse...

Uau! Sempre achei que na dor escrevemos melhor que na alegria...

Fabrício César Franco disse...

Anne,

Também achava isso, até uns anos atrás. Uma hora (epifania sempre acontecem sem determinar-se direito quando, não é?) veio-me a luz de que o texto sofrido pode ser bom, mas é uma repetição. E o repetido me causa um cansaço enorme. Perguntei-me por que não dar chance a outros sentimentos, mais solares, digamos? E hoje escrevo tanto sob chuva (interna, claro) quanto sob a inclemência desse nosso sol do sertão... :)

Beijo!

Anônimo disse...

Conheci este poema, assim que ele foi criado. Você cursava DIREITO, na UFMG; era um jovem universitário, que registrava a SINOPSE dos dias que experimentava, plenos de compromissos e ansiedade...
Assim é a VIDA, meu caro POETA: pensamento/sentimento/ação... "DUM VIVIMUS, VIVAMUS"!
Grande abraço,
Andrea Marcondes

Fabrício César Franco disse...

Andrea,

Que, nesse enquanto, haja - ao menos - poesia.

Abraço, com intenso carinho!

Anônimo disse...

Fico sempre na torcida pra que seu dia seja melhor que o dia anterior e para que no fim dele, você possa notar todas as coisas, ainda que pequenas, que fizeram o dia valer a pena. :)

Ah, gostei da foto! Foi você quem tirou?

Beijobeijo

Indi

Fabrício César Franco disse...

Indi,

Obrigado pelo alento. Vezes há que escrevo para mim mesmo, para que eu me (loco)mova rumo ao que - como mencionou - vale a pena.

Sim, fui o (feliz) fotógrafo. Uma das chances que o obturador pegou exatamente o que eu via (e como eu via).

Beijo, com carinho!

 
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